Se
existe uma mulher que enche os muanenses de orgulho, esta é Adalcinda Camarão.
A Poetisa nascida na Flor do Marajó ganhou o mundo, é membro eterno da Academia
Paraense de Letras, e morou por mais de 40 anos nos Estados Unidos, fazendo
diversos trabalhos, desde professora de língua portuguesa para estrangeiros,
até funcionária da embaixada brasileira em Washington.
Sua
data de nascimento ela nunca se preocupou em revelar, porém é muito provável
que tenha sido no mês de julho, e por isso o blog fará essa humilde homenagem a
esta que foi e é uma das maiores personalidade do Marajó.
Certamente
a poesia é o feminino que encontra no masculino do poema um casamento perfeito.
União fértil da qual o lirismo é sempre o fruto maior. Quando o traço da poesia
fecunda o espírito de uma mulher o resultado quase inevitável é a própria
tradução de encanto. E tudo isso pode ser provado com o legado de Adalcinda.
Foi
num reino todo singular que essa dama das letras nasceu. No reino absolutamente
verde e misterioso da ilha das ilhas: o Marajó. Uma serena e acolhedora Muaná
fez-se seu berço. A data? Ela nunca viu necessidade de revelar. Dizia apenas
que tinha sido num mês de julho. Numa época outra. Num tempo bem mais melódico.
Adalcinda Magno Camarão Luxardo foi uma das filhas do meio de João Evangelista
de Carvalho Camarão e Camila de Brito Magno Camarão. 'Minha mãe era uma
mulherzinha tão bonita', ela suspirava ao falar. E fazia questão de garantir:
'Meu pai também era um homem muito interessante'. Uma família grande: treze
irmãos. Por parte materna, o orgulho de descender da célebre figura de Santa
Helena Magno. O versificar parecia já vir como um fator de herança sangüínea.
VERSOS
RASGADOS
O
repertório de imagens ribeirinhas oferecido por Muaná e seus entornos se
instalariam nas íris de Adalcinda e não demorariam a despertar a vontade de
escrever. O que começaria a se materializar a partir de seus dez anos de idade.
Vocação que a família, de início, não veria com bons olhos. Com um riso fugaz
nos lábios, a autora chegou a revelar: 'Rasgavam todos os meus escritos. Meu
irmão mais velho dizia que não queria uma mulher intelectual em casa'.
Veio
o tempo de freqüentar o curso ginasial. Adalcinda e seus pais se mudaram para
Belém. Como rezava a boa tradição da época, ela começou a cursar o grupo
escolar com um objetivo já definido: tornar-se professora. Aquela era, por
excelência, a profissão que as meninas bem encaminhadas deviam seguir. Décadas
mais tarde, todavia, ela admitiria: 'Meus pais me queriam professora e assim
aconteceu: eu me fiz professora. Um título apenas'.
FERTILIZAÇÃO
A
faceta de poetisa começaria a ser fertilizada numa época em que a arte
brasileira vivia os sopros do novo, mergulhava numa profunda reverência ao
valor nacional. Ventos trazidos pela revolução estilística iniciada na semana
de 1922, em São Paulo. Era o período da ebulição do modernismo. Os versos de
Adalcinda, de algum modo, banharam-se nesse apelo. Floresce em suas aptidões um
versificar em sintonia com esses novos ares. Um tom poético liberto do
preciosismo do passado, mas fiel à melodia da palavra. Um modo sereno e, ao
mesmo tempo, pungente de criar estrofes.
Em
Belém, era efusivo o cenário literário. Adalcinda é um dos pioneiros toques
femininos nos ciclos da intelectualidade local. A geração atuante a qual
pertenceu, fez surgir na cidade uma considerável quantidade de revistas
literárias. Foi justamente na redação de uma destas publicações, a célebre 'A
Semana' que, aos dezesseis anos, conheceu o cineasta Líbero Luxardo. 'Um
encontro casual. Eu costumava freqüentar a redação, cantava nas rodinhas de
violão que eles faziam. Naquele dia, eu tinha ido buscar um magazine e nos
encontramos'. A escritora e o homem das telas se casaram e tiveram um filho:
Tom. 'Além de seu conhecido encantamento pelo cinema, Líbero também gostava
muito de escrever. Aliás, ele tinha uma facilidade imensa para criar textos.
Mal acabava de passear por um tema, já estava debruçado sobre outro'.
ACADEMIA
Em
1949, um fato marcante na trajetória da poeta. A despeito da pouca idade,
Adalcinda é eleita para ocupar a cadeira de número 17 da Academia Paraense de
Letras. Posto cujo pioneiro ocupante fora Felipe Patroni. Um feito notável.
Sobretudo, pelo fato de que – após a também paraense Guilly Furtado – Adalcinda
era uma das primeiras mulheres a preencher vaga em academias literárias no
Brasil. Ela chegou a anteceder Raquel de Queiroz, a primeira na Academia
Brasileira. Sua posse ocorreu no dia 25 de janeiro de 1950. 'Eu me recordo que
estava muito nervosa. Achava que não ia conseguir fazer o discurso. Cheguei a
pensar em não comparecer a cerimônia. Mas o Líbero, com toda sua calma, disse
que eu não me preocupasse, que eu apenas fosse até lá e deixasse tudo
transcorrer naturalmente.
Adalcinda
acabaria fazendo com que seus ditos cruzassem várias trincheiras. Escreveu para
rádio, teatro e para diversos jornais. Na década de 50, mudou-se para os
Estados Unidos por conta de uma bolsa de estudos. No ano de 1960, instalou na
Georgetown University o Departamento de Português, no qual lecionou Literatura
do Brasil e de Portugal.
A
última estrofe do viver de Adalcinda foi escrita em 17 de janeiro de 2005. Um
adeus de quem fica. Como é comum acontecer aos eternos. As grandes poetas são,
de fato, mulheres sem tempo certo no tempo. Mesmo que o tempo de hoje lhes
traga desagrado. Antes de se tornar letra no horizonte, ela desabafou: 'Não
gosto desses arranha-céus no centro da cidade'. Que doce contradição: hoje é a
alma dessa rara paraense que arranha todos os céus. Quando o eterno encontra os
dedos de uma dama, a única motivação que a escrita recebe é a de executar o
belo. E é justamente por tudo isso que a melhor palavra para encerrar qualquer
dito sobre Adalcinda Camarão é... beleza.
"Quando
se nasce para ser eterno Morrer é uma especulação" (Adalcinda Camarão)
Fonte:
Blog do Heider Nunes e Amazônia Jornal
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